terça-feira, 7 de junho de 2016

O dia em que não teve filme

Territórios sensíveis-Maio de 2015. Escolas ocupadas.Meier. Aos que pensamos que as artes e, principalmente, o cinema, são ferramentas de transformação social, concluir que, por vezes, a arte não dá conta de transmutar a realidade pode ser uma dura constatação. Em algumas situações, não basta termos a ferramenta estética no sentido da fruição. É preciso recuar e chegar ao nível da necessidade básica, posto que, quando estas não são satisfeitas,é impossível transcender o real. Essa foi a situação encontrada na escola ocupada que visitamos, menos para exibição de filmes do que para ajudar os meninos que ali estavam. Na véspera,o governo havia cortado o repasse de passagem para os alunos e muitos não podiam comparecer às escolas.Havia falta de água e ,em alguns casos,até luz.O grupo se dividia na imensa escola entre cortar grama,varrer, organizar o pátio e cozinhar. Havia muito que fazer e o abandono da escola era evidente, assim como o empenho de alunos e professores com a recuperação do espaço. Ocorre que um coletivo de pessoas é um coletivo de pessoas.Há quem mande, quem assuma todas as tarefas,quem enrole e quem literalmente não faça nada. Enquanto tento cozinhar três quilos de arroz observo os meninos, em constante negociação e trabalho e penso na importância do cinema em um ambiente como aquele. Naquele momento a arte não faz a menor diferença, para quem precisa decidir se tenta resolver o problema da água ou da comida. Estar junto com os alunos então não se resume a ajudar na organização dos trabalhos, suscitar consciência critica sensibilizá-los e trazer referências estéticas. Não!Definitivamente estar junto significa varrer o chão, mexer o arroz, aparar a grama, trazer um bolo, ouvir a mesma música e rir das mesmas piadas. Quando tudo é escassez, a experiência estética não é complementar ao cotidiano, ela se torna o cotidiano, na medida em que nossos sentidos e sensibilidades devem estar em consonância com o outro, amparando-o em suas necessidades para que possa,o mais rápido possível,voltar a sonhar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário